sábado, 26 de julho de 2008

X MOTIVOS PARA SE TER UM BLOG

X MOTIVOS PARA SE TER UM BLOG

Igor Fagundes

Sujeito inviável: aberto aos desentendimentos
como um rosto.

Manoel de Barros

A coisa começa a clarear, não por acaso, na sala de espera de um consultório. Of-tal-mo-ló-gi-co. Completamente nítida, apenas a pobreza lexical que ora me assalta as córneas e a página, certas de que empregar a palavra coisa, logo assim, de cara, na ponta de uma prosa, só pode ser mesmo coisa (opa!) de um velho astigmata. Desde criança, tento me livrar das nebulosas. Seja com a ajuda de óculos, lentes de contato, rígidas, gelatinosas, anti-reflexos; seja com as microscópicas leituras do mundo refratado em livros, que não me proporcionaram nada além do que o agravamento da deficiência. Na falta de maior precisão (e dinheiro para a cirurgia corretiva), não enxergo outro termo que me pareça mais exato para definir tal embaço com que todo começo vem à tona. Claro está que, saindo da obscuridade, toda idéia não passa disto: de uma coisa, vaga e absorta (e peço desculpas pela redundância com que ambos os adjetivos contaminam o corpo insubstancial desse polêmico substantivo).
Não é por padecer, ademais, e também, míope nesta terra, que não posso minimamente vislumbrar que reside aí, na insuficiente acuidade ótica de todos nós, a origem de toda a minha difusão. Afinal, a tal idéia que começa a clarear (ou que começam a clarear para mim, deficiente – cármico – que sou) consiste na decisão de abrir um blog, espécie de diário supostamente apto a compensar minha quase cegueira e no qual a voz, convertida em letra, me concederá o alívio de revelar o astigmatismo, a miopia e a hipermetropia dos seres humanos deslumbrados com a cristalina certeza do que pensam ver, fora ou dentro de si.
Um blog para quê? Para falar sem ser ouvido? Para que o leiam sem enxergá-lo e enxergar as coisas (!) que, na escrita, (não) se mostram? Para que o enxerguem sem lê-lo, sem escrevê-lo nas retinas, sem inscrevê-lo no breu íntimo em que cada um (não) se reconhece? Para deixar mais escondido o que se desencobre? Para desencobrir-me, desencobri-lo, cobrindo-me, cobrindo-o com vendas? Para vendar os que... vêem? Vêem?! Para, enfim, fazer com que todos desistam de mim (ou de si), de ler-me (ou de lerem-se) e interrompam, surdamente, suas visitas ao antro de narciso, divã recíproco, jogo de cabra-cega onde não há vencedores nem materiais recompensas; quando ninguém tem tempo, neste mundo de objetivos e objetivas, para a perda do foco e para a luta contra os limites de uma visão anestesiada que, tida como soberba, se/nos trai, se/nos fatiga diante dos pixels da tela e, (in?)voluntariamente, desiste de continuar a leitura.
Se, para escrever em um blog, é necessário retirar os óculos para ver mais, lê-lo obriga-nos à humildade de descobrir, na verborragia alheia, um pouco do que os globos oculares, sobretudo os tidos como sãos, silenciam. Este, o desafio: fazer com que uma palavra valha por mil imagens, ou mil e uma, para lembrar a Sherazade das mil e uma noites e as mil e duas que os insones da internet perdem, absorvidos pela sinestesia dos micros.

Coço-me a nuca e... pronto! Posso ter perdido mil e três leitores depois de uma palavra sinestesia proferida em hora errada. Rebusquei? Nada sei de público-alvo, nem sei se há público (ou se tudo é privado, privada, descarga, lixo...) nas muitas vozes que me habitam. Miro somente: as palavras. Talvez as acerte em cheio ou eu, cheio de desacertos, chute (ora) bolas para todos os lados, acreditando que existam traves e redes fora da grama. Ufa! Possível que um futebolzinho jogado no meio de tanto eruditismo (que é a erudição tornada patologia) alivie alguma aparência pedante e achem-me, por Zeus, menos antipático. Falo sério: não que chame burro ou inculto o internauta que me perscruta (essa palavra também me incomoda, por demais polida), mas o fato é que ela, a sinestesia, se dá com tamanha força nos hipertextos da informática, que o ato de torná-la uma palavra a enfraquece com uma newtoniana força de atrito, a dissipar, desta tração, mil e quatro internautas, educados a comparecer espectadores e ouvintes (quando muito), em vez de propriamente leitores. Em se tratando de sinestesia, mil imagens valem por uma palavra. Ingenuidade pensar que seduzo alguém com termo tão corriqueiro, a rigor, nos manuais de teoria da literatura, quando aquele que me averigua está com mil e cinco janelas abertas no windows, entre msns, orkuts, photoshops, downloads e outros vícios que, em inglês, parecem ainda mais sinestésicos.
Não disse, mas se dá em português, na flor do lácio, a tempestade de sensações que começa a tomar-me os dicionários mentais na sala de espera do consultório. Of-tal-mo-ló-gi-co. Sou um defensor da língua e, diante de revelação nada neoliberal e sugestiva de certa sisudez reacionária, fogem desta página mil e seis indivíduos, acidentalmente aqui hospedados e que, no fetiche de se elegerem cults, se declaram fãs do PSTU e da Gramática Descritiva (embora a maioria sequer saiba da existência de uma gramática, quanto mais de uma gramática não normativa). Não podendo me normatizar, digo aos descritivos que a exceção é a regra e, nesta blogagem (homófona im-perfeita de bobagem), não haverá nenhum internetês a descrever-me e quaisquer outras abreviaturas resultantes da velocidade com o que o planeta precisa escrevinhar para, em seu time is money, perder definitivamente todas as referências e parâmetros e desconfiômetros, acelerando o apocalipse anunciado para daqui a muito menos do que mil e sete noites. Pessimista, eu, jamais, porque se o fosse, não fundaria esta morada de Sherazade pós-moderna, sabendo que morreríamos todos e que, enquanto vivos, nenhum de nós adentraria um recinto onde mesmo meu astigmatismo míooe raramente transita, salvo nos casos em que posta novas inutilidades disfarçadas de rito para deus nenhum. Condescendentes, na verdade, os olhos, porque, tirando os óculos, apalpam a obscuridade que, em cada um dos seres nela abismados, acelerará a dinâmica – empoladamente sinestésica – do temido fim que poderá ser, ao revés, um início.

E ainda lá (ou aqui) no início, me (des)encontro, a esperar – pela milésima oitava manhã – a consulta médica que, finalmente, não começa. E, não começando, não passo a limpo a idéia de estar em casa a clarear de vez o ímpeto de sujar a vista com estes rascunhos. Tento esquecer que preciso da escrita, mas olho o relógio. Tento me distrair com algumas revistas, mas me lembro de que não me havia esquecido: da escrita que sobressai dos ponteiros enrolados no pulso e da magazine que nada me informa a não ser da gravidez de uma atriz recém-casada com um recém-contundido jogador de futebol. Ah, o futebol! Sempre a socorrer-me quando o discurso se dissemina em distúrbio. Admiro-me quando consigo fingir que admiro uma partida só para me sentir igual a todos os outros. Preciso esquecer que sou esquisito e diferente. Preciso esquecer que preciso esquecer-me da escrita. Do blog. Esquisitamente semelhante aos demais mortais desejos de imortalidade virtual. Se ainda houvesse uma televisão nesta sufocante sala de espera do consultório of-tal-mo-ló-gi-co (talvez procure um pneumologista, estou com dificuldades de respirar enquanto releio o que escrevo), buscaria alguma canal em que estivesse passando a milésima nona reprise da final da copa de 1950, ano em que, provavelmente, estava a despedir-me de minha última encarnação. Preciso esquecer. Não me lembre disso, de que preciso esquecer e esquecer e esquecer não só da ausência de televisão, do futebol, da reprise e da reencarnação que (não) me fazem parar de enxergar o blog que se agiganta como se, sob as pálpebras, tivesse meu rosto duas lupas, no lugar dos olhos. Obrigo-me a esquecer-me do reprimido desejo de enxergar ao longo da vida que, agora saciado, oprimo, e refuto, em insultos forjados no incesto de roer as unhas.

Há uma biscoiteira na mesinha de canto da recepção. Certamente, nela agonizam aqueles biscoitos sem sal com prazo de validade vencido, moles, molengas, e que não se deveriam oferecer, em hipótese alguma, a pacientes que, débeis da vista, possuem o paladar aguçado, a fim de aferir nos alimentos o sal que lhes é escasso no interior das lágrimas órfãs de - decentes -retinas. Deixe-me examiná-los: it’s a cream-cracker! Fumante há mil e dez anos, papai conseguiu, no duelo contra o vício, substituir o cigarro por doses diárias de cream-cracker com queijo de minas. Antes, durante, depois das refeições e, óbvio, na hora de dormir. Enfio todos estes biscoitos na boca como quem quer fumar e não pode, como quem quer fumar e não gosta do fumo, como quem quer gostar de fumar e não consegue, como quem consegue, naquele momento, imaginar-se um fumante sem maços, refém de cream-crackers que me fazem – não me fazem – esquecer a fumaça do blog na qual irremediavelmente me vicio.

Viciado na esfumaçada luz a que chamo idéia a clarear na sala de espera de um consultório of-tal-mo-ló-gi-co, balanço pernas, coço os braços e o companheiro da poltrona à esquerda pede-me que pare com os tremeliques, uma vez que lhe causam taquicardia e, sem fraquejar, ofereço-lhe - sim! - um delicioso - não! - cream-cracker para acalmá-lo. “É tiro e queda. Só não tem queijo de minas”. Ele volta a ler a notícia da grávida atriz blá-blá-blá-blá e, da poltrona à direita, uma senhora dispara: “Hein?”. Não lhe dirigi o verbo. Devo estar pensando alto, pensei. Ou falando sozinho. Impossível: o blog acompanha-me e, entre nós, um pensamento sussurra, inquietante, intransigente. “Cale-se!”, ordeno a mim e a ele, como se nos obedecêssemos. Estou enxergando! Não era esse o meu objetivo no consultório of-etc-e-tal: enxergar? O blog surge-me nítido, decisivo. Lá dentro, a doutora ficará feliz. Ou não: perderá um paciente, há mil e nove manhãs sem paciência de esperar consultas sem televisão, sem futebol e sem queijo de minas dentro de um cream-cracker vencido e a vencer a invisibilidade de um cigarro que nunca fumei. Sem problemas: depois enviarei um e-mail à senhora Scarlet, especialista em lentes de contato, divulgando o endereço do meu diário virtual, na esperança de que ela, quem sabe, escreva um comentário gentil no fim de um post. No rodapé de meus textos, permaneceremos juntos.
Não é assim? Inventamos o bendito blog, fazemos uma mala direta para os amigos, familiares, vizinhos, namorados, namoradas, ex-namoradas, ex-amigos, ex-familiares (sim, e está na moda e também em alta é discutir com o ex de si mesmo), colegas etéreos do Orkut, espectros (sub)humanos do MSN, a fim de mostrarmos nosso dom, nossa volúpia lingüística e a espetacularização do eu que todos praticam e poucos assumem. No mais das vezes, meia dúzia dos mais íntimos visitam-nos, deixam um recadinho simpático no pé da prosa para que nos sintamos queridos (ou para que se sintam queridos diante de nosso agradecimento) e adeus. Nunca mais. Os anônimos curiosos? Comparecem? Estes não têm estação de desembarque. Existem até o momento em que passam por nós, no exato agora em que matam sua curiosidade e partem a outras plataformas que, desconhecidas, alimentarão interesses provisoriamente novos ou duradouramente fugazes.

Peço à recepcionista um pedaço de papel. “Este lenço para os olhos, qualquer coisa onde eu possa escrever e pôr em prática a idéia que começa a clarear!”. Ela (não) responde: “O senhor já pingou o colírio?”. E recomendo-lhe um otorrino. “O-tor-ri-no-la-rin-go-lo-gis-ta. A senhora só sabe pingar essas gotinhas nos olhos da gente, para dilatar as pupilas enquanto a senhora Scarlet não nos chama! Não há gotinhas para os ouvidos? Um lenço, por favor! Prometo dedicar ao consultório o primeiro post. E citar-la-ei. Será bom em termos de marketing e, de repente, vocês consigam juntar dinheiro para comprar um pacote de cream-creaker dentro do prazo de validade ou instalem uma TV com canal a cabo e paper view, de modo que um um futebolzinho amenize minha intolerância. Mas ofereçam queijo de minas como recheio e assim não precisarão colar na parede adesisvos de é proibido fumar, que só aumentam a ânsia de quem tem o vício. Não, não sou viciado. Mas hoje me sinto fumante. E me respeite”.

Entre míopes, astigmatas e hipermetropes, os pacientes voltam-se todos para mim. Desta vez, sou eu que lhes pareço claro. O centro de suas objetivas. Nunca tão nítido me vi. Ouvem-me. Menos a atendente-pingadora de colírios dilatadores, a quem peço que repita o nome do médico especialista recomendado. “Memorize”. E ela se atrapalha, confunde otorrino com ornitorrinco, sequer chega pronunciar o segundo capítulo da palavra, laringologista, e faz-me, com ardiloso carinho, orientá-la a procurar uma fono. “Fonoaudióloga. É um nome mais fácil. Anote!”. Venço o duelo. Ou não. Afinal, não consigo escrever nestes lenços. A caneta falha. A inspiração expira. E descubro que minha criatividade está completamente condicionada pelo teclado, mouse e Microsoft Word. Desde que adquiri o micro, uso caneta esferográfica para rápidos traçados, estudando formas de fazer assinaturas mais ilegíveis, lépidas e menos custosas para os dedos. “O cream-cracker acabou. Tem mais?”.

Feliz, finalmente, diante das teclas através das quais a idéia começa a clarear fora – e, estranhamente, ainda dentro – da sala de espera do consultório of-tal-mo-ló-gi-co. O alívio só não é maior porque, enquanto digito, tento segurar o velho - e põe velho nisso - cream-cracker com a boca, de modo a impedir que algum farelo desça aos vãos do teclado. Engasgo: algum farelo desceu aos meus vãos. Falha no mastigar. Pelo menos, aqui, em casa, tem queijo. Derrete na boca. Tem de Minas, prato, provolone. Queijo fungado. Quando tasquei um beijo na testa de doutora Scarlet, em retribuição à clareza sentida em minhas córneas e em meus cristalinos, ela passou os dedos por sua asséptica cútis como se a varrer algum integrante do Reino Fungi a passeio por meus lábios na hora justa do gesto mais afetuoso. Azar o dela. Nem todo fungo é do mal.

Alguém corte a fitinha na entrada da casa! Declaro inaugurado o blog, ainda que a certidão de nascimento já venha acompanhada com a de óbito. Tentaremos sobreviver. Todos. Não garantimos. Do contrário, não nos culpemos. O apocalipse, conforme anunciei, vai chegar. Em mil e tralalá noites.

Se, ao leitor, ao ledor ou seja lá o que for, tudo soar enfadonho, nada mais fácil que ir, com o mouse, ao canto superior da tela, à direita, e clicar no conhecidíssimo “x” que nos infla com o poder de fecharmos as janelas que não apontam para paisagem alguma. Graças a Zeus há os que preferem pastagens. E, contando com estes, espero marcar um x, um x, um x no seu coração. É o estribilho de uma música da Xuxa, não? Por isso, lidar com a letra x não tem nada de novo e difícil em nossas vidas. A exemplo da rainha dos baixinhos, o x acompanha-nos desde sempre. Recordo-me, inclusive, de quando deixei de ser criança para transformar-me em menino. Papai revelou-me aos quatro anos: “Você não fará mais pipi. Garotos fazem xixi. E, quando ficam crescidos, mijam. Sozinhos no banheiro. Ou no meio da rua. Coisa de macho”. E eu pensava, na pista da Xuxa, ser coisa de mulherzinha a mania de x. Pior que era: com papai fui aprendendo a falar xereca, xoxota, xana, xibiu, essas palavras feias para lugares gostosos que farão meu blog aparecer no google quando algum sexomaníaco digitá-las em procura. O x também guarda essa aura do grotesco. Xuxa que o diga, sobretudo ao lado de praga, dengue e outras apologias a doenças em seu xou. Difícil de se livrar da praga da Xuxa. Ainda não nos livramos. Doença mesmo. Aedes xuxipt.
Importa mesmo é que convivemos com o x mesmo antes de nascer. Cansei de ouvir uma voz, do lado de fora da barriga de mamãe, ecoando: “Xxxxxx”. Pedia silêncio a quem estivesse por perto, a fim de conseguir escutar o choque de meus pés contra as muralhas do útero. “Está chiando, o garoto. Doido para sair daí”, completava. “Coisa de carioca, esse chiado”, alguém brincou, instaurando a saga do x até no jeito de falar. Mas, na internet, vale uma errata: é xiado. Economiza letra e, como convém à xaga (talvez mais chaga do que saga), fica ainda mais grotesco. Mais Xuxa. Outro dia, um amigo me convidou por e-mail: “Vamos a um xurras?”. Leia-se: churrasco. “Xau”, despediu-se, no fim da longa mensagem feita de xinco palavrinhas.
Portanto, e da mesma forma que excluo todos esses expertinhos de minha lista de e-mails (alegam, na sinestesia do inglês, um diminutivo neológico para expert), poderá algum também axar-me um xato, clicar no x da janela e beixinho, beixinho, xau, xau. Não será o primeiro nem o último x da vida. Desde sempre, submeto-me às angustiantes provas de múltipla escolha da existência. Aos x’s dos formulários. Dos crediários. Das pesquisas de campo. Elego pessoas, coisas, fatos, sonhos. Alguns e algumas me elegem. Marcam-me. Marcam-se. Em mim. Excluem-me. Excluem-se. Há sempre uma alternativa. Uma estatística. Um x a calcular, a encontrar. E outro, em incógnita. Para sempre. Uma equação de segundo, enésimo grau. Um y. Na transversal. Um plano cartesiano. Uma curva no gráfico. Uma raiz de delta, insolúvel, nietzschiana. Um problema para riscar. Um poema para arriscar. Hoje mesmo arrisco-me a escrever, como agora, acerca da idéia que clareia na sala de espera do consultetc-etc-etc, quando se esperaria, afinal, riscar, com um x, a oftalmologia do meu universo de consultas para as próximas mil e onze noites.
Por isso, alguém outrora disse: escrever é um risco. No duplo sentido. E blogs têm boa acústica: posso gritar sem fazer barulho. Talvez precise exceder o tom da voz apenas com a recepcionista-pingadora de colírios, que quase fez ouvido mouco à minha agonia. Em blogs também posso tascar beijocas na testa dos outros sem risco algum de micoses ou infecções bacterianas via contato oral. Por blogs, poderei fazer até sexo. Oral. Anal. Mensal. Quinzenal. E sem preservativos. Perigo algum de doenças. À exceção da xuxopatia. Xiiiii.... Déxa extô lirvre. Neste mundo que reservou muito pouco de visão e visibilidade, mas o suficiente para reconhecer onde posso e devo inserir um “s” ou dois, melhor mudar de aSSunto e terminar com um poema. Assim fica melhor. Fica chique. Uma palavra – bem dita em português – vale mais do que mil sinestesias. E aos que não têm motivos para fundar um blog e se afundarem junto com ele, perdão por roubar o espelho da madrasta de Branca de Neve. Vai dar meia-noite e ainda estou na sala de espera do consultório of-tal-mo-que-preguiça-de-continuar. Preciso voltar para casa. Para minha outra casa. E acordar. Senão, viro abóbora:

A realidade é coisa delicada,
de se pegar com a ponta dos dedos.
Um gesto mais brutal, e pronto: o nada.
A qualquer hora pode advir o fim.
O mais terrível de todos os medos.
Mas felizmente, não é bem assim.
Há uma saída - falar, falar muito.
São as palavras que suportam o mundo,não os ombros.
Sem o "porquê", o "sim",todos os ombros afundam juntos.
Basta uma boca aberta (ou um rabisconum papel)
para salvar o universo.Portanto, meus amigos, eu insisto:
Falem sem parar . Mesmo sem assunto.

(Paulo Henriques Britto, “De vulgari eloquentia”)